segunda-feira, 18 de março de 2024

FALECEU A 17 DE MARÇO Nuno Júdice, o poeta "operário da escrita"

Nuno Júdice (Foto DN)

      Faleceu este domingo, 17 de março, com 74 anos, o poeta Nuno Júdice. Em muitos dos seus livros fez poesia que poderíamos chamar de autorreflexão e foi essa poesia, muito em ritmo de prosa poética, que fez o seu êxito pela diferença. A sua poesia mais recente é mais do âmbito do quotidiano e é considerada menos original. Nuno Júdice esteve para vir à Guarda e falar aos alunos das escolas no último ano letivo em ligação com a BMEL e as Bibliotecas Escolares, tendo acabado por adiar esta vinda por motivos de saúde. Aqui fica um poema de Nuno Júdice:


A Vida

A vida, as suas perdas e os seus ganhos, a sua

mais que perfeita imprecisão, os dias que contam

quando não se espera, o atraso na preocupação

dos teus olhos, e as nuvens que caíram

mais depressa, nessa tarde, o círculo das relações

a abrir-se para dentro e para fora

dos sentidos que nada têm a ver com círculos,

quadrados, rectângulos, nas linhas

rectas e paralelas que se cruzam com as

linhas da mão;

 

a vida que traz consigo as emoções e os acasos,

a luz inexorável das profecias que nunca se realizaram

e dos encontros que sempre se soube que

se iriam dar, mesmo que nunca se soubesse com

quem e onde, nem quando; essa vida que leva consigo

o rosto sonhado numa hesitação de madrugada,

sob a luz indecisa que apenas mostra

as paredes nuas, de manchas húmidas

no gesso da memória;

 

a vida feita dos seus

corpos obscuros e das suas palavras

próximas.

 Nuno Júdice, in "Teoria Geral do Sentimento"

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